Brasil e Argentina entraram em campo para o jogo vendido, como reza a tradicionalidade, como um dos maiores clássicos mundiais. A promessa era que ali, em pleno Monumental de Nuñes, na capital portenha, dois rivais históricos disputariam uma partida memorável, uma refrega esportiva digna dos grandes embates épicos proporcionados pelo futebol.
90 minutos depois, restou a conclusão que a rivalidade esportiva não entrou em campo. Não compareceu. Entraram outros ingredientes que podemos elencar mais a frente. Na real, só um time jogou e mereceu o placar elástico de 4 a 1. Acho que foi pouco.
Quando falo “rivalidade esportiva” quero me referir ao que dá beleza a um espetáculo superior. A força, a habilidade, a técnica por parte dos rivais é que é capaz de emprestar magia a um embate. Em colisões de forças minimamente equivalentes, ninguém humilha ninguém e a vitória, se houver, será conseguida “nos detalhes”, como dizem os cronistas profissionais.
Nesses casos, até a derrota é honrosa e tem lá sua beleza e as justificativas são todas válidas. Numa disputa onde só um dos lados esbanja técnica e a traduz em eficiência, a rivalidade esportiva é nula.
O futebol do Brasil frente aos hermanos sempre é promovido com base nos aspectos, digamos, da mesquinharia humana. Coisas como “orgulho pátrio”, que inclui preconceitos, ressentimentos, aspectos econômicos, políticos e sociais e, em último caso, a recorrência à porrada.
Nesse último aspecto, sempre achei que as celestes da América do Sul confundem “maldade” com raça e aguerrimento. Talvez o gigantesco da terra brasilis e mágoas históricas explicam em parte essa tendência. Essa rivalidade periférica faz parte inevitavelmente da cultura do futebol, mas não deve se constituir num projeto.
A excelência futebolística, está sim, é que deve ser cultuada e cultivada. É ela que pode nos garantir glórias futuras.
O comportamento passional no esporte é, inicialmente, irracional, descambando fácil para a prática do racismo e preconceitos diversos. Em campo, a catimba, o migué, o antifutebol, o dedo na cara, a jogada maldosa e outros expedientes fazem parte do arsenal há décadas. Por eles, certa interpretação concede a alcunha de “raça em campo”, o que, como já dissemos, é um ponto discutível.
No encontro da última terça, jogo disputado pelas eliminatórias para a Copa do Mundo 2026, o time argentino sobrou em campo. A esquadra alvi-azulina minimizou a recorrência - e, talvez, nem precisou - das suas armas tradicionais e simplesmente jogou futebol. O Brasil, fera acuada, sem armas naturais a não ser um ímpeto de peito, pouco pôde fazer.
Os hermanos, por sua vez, nem precisaram recorrer aos meios “raçudos” que compõem seu mito, sua lenda. Bastou jogar futebol. O time brasileiro levou ao campo os olhos injetados e os narizes inflados. Pelo lado futebolístico, técnico e tático, não se houve em campo. Não se viu um time como o conceito do esporte concebe, mas um amontoado de jogadores defendendo um orgulho sem qualquer estratégia bonita de se ver. Reafirmo. 4 x 0 foi pouco.
Edson de França, pessoense, é jornalista, cronista e poeta.
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