Pedro Delgado, artista visual nascido em João Pessoa e autor da exposição "Guerreiros do Sol", encontrou sua vocação artística no teatro e, em 2019, descobriu na pintura sua verdadeira paixão, levando-o a abandonar a arquitetura e o teatro para se dedicar integralmente às artes visuais. Inspirado pelas paisagens e luz da cidade natal, ele iniciou sua carreira explorando a abstração, mas, após se mudar para o Rio de Janeiro, o contato com outros artistas nordestinos enriqueceu sua visão cultural. Hoje, sua obra reflete essa troca e aborda questões de identidade e a complexidade da cultura nordestina.
Recentemente, Pedro estreou "Guerreiros do Sol", no Espaço Arte Brasil, em João Pessoa, com 25 obras em óleo sobre tela, com uma temática que propõe uma releitura ousada da masculinidade nordestina. Sob curadoria de Daniel da hora, Pedro subverte estereótipos ao retratar o corpo masculino com sensibilidade, fugindo das imagens tradicionais de força bruta e resistência, típicas da cultura local. Suas obras reimaginam a identidade masculina, sugerindo uma nova visão para o homem nordestino na arte contemporânea — um ser que pode ser forte e sensível ao mesmo tempo.
Na entrevista que segue, é possível conhecer um pouco mais deste novo artista que vem chamando atenção por sua visão autêntica do nordestino, por meio das obras.
Como nasceu a ideia de criar a Guerreiros do Sol e quais foram as inspirações?
A ideia de criar a série "Guerreiros do Sol" surgiu enquanto eu explorava temas de corpos masculinos em ambientes abertos, e soube que a Globo estava produzindo uma série com o mesmo nome, focada no cangaço e na cultura nordestina. Esse paralelo com o universo do cangaço me inspirou a desenvolver a série com uma visão própria. Quis representar a força e brutalidade desses guerreiros, mas trazendo um toque de sensualidade que o cangaceiro tradicional não carrega. Os meus 'Guerreiros do Sol' são uma reinterpretação desses corpos masculinos, explorados sob uma ótica de força e intensidade, mas também de vulnerabilidade e sensibilidade, trazendo algo novo e único à representação dos guerreiros nordestinos e, para ficarem prontas, as obras demoraram quase dois anos.
Como foi esse processo criativo?
Meu processo criativo começa com uma ideia inicial que, aos poucos, vou amadurecendo. Normalmente, penso em uma mensagem que quero transmitir — como no caso da série "Guerreiros do Sol", onde busquei enfatizar e desconstruir o corpo masculino. Queria dar a ele uma suavidade e flexibilidade, afastando essa imagem rígida e padronizada da masculinidade. A partir dessa ideia central, vou experimentando diferentes formas e abordagens em pintura, tentando alinhar o que quero dizer com o que quero mostrar. Para mim, a pintura precisa carregar uma narrativa que tenha uma visualidade coerente; as ideias e as imagens têm que dialogar. Esse processo envolve muitas tentativas e ajustes até alcançar a expressão que busco. Com Guerreiros do Sol, foram necessários quase um ano de estudos e amadurecimento das pinturas até chegar ao formato exposto recentemente no Espaço Arte Brasil. Em cada série, o processo é uma experimentação contínua, onde, às vezes, gosto do resultado logo de início, e outras vezes sinto necessidade de mudar, ajustando até a obra final refletir exatamente o que quero comunicar.
Existe alguma influência ou algo que impacte no seu estilo de criar?
Acho que minha maior influência como artista vem do teatro. Foi ele que me fez enxergar o que é ser artista e, até hoje, me inspira profundamente. O teatro me ensinou a entender o corpo, a perceber que ele é um instrumento expressivo, que comunica. Essa vivência me deu a base para explorar a pintura como uma extensão do corpo, como uma performance.
Quando estou pintando, sinto que há algo teatral no processo: é como se eu fosse o ator e a tela, o palco. A interação com o quadro é muito expressiva e intuitiva, uma troca constante onde cada pincelada rápida e intensa parece uma ação dramática, sem espaço para muita reflexão. Para mim, pintar é atuar; é uma expressão corporal em que cada movimento traz vida à obra. O teatro é, sem dúvida, minha maior referência, moldando desde meu ato de pintar até a maneira como enxergo a arte.
A exposição Guerreiros do Sol nasce desta ideia do corpo em movimento. Quais as inspirações para as poses retratadas nas obras?
Muitas das poses nas minhas obras vêm de autorretratos; são posições que eu mesmo fiz em sessões de estúdio com um amigo fotógrafo. Criamos essas poses juntos, e depois as trouxe para a pintura, dando-lhes uma nova vida. Algumas outras referências vêm da internet, onde busco imagens que tenham uma conexão com o que quero transmitir ou que tenham uma estrutura interessante que posso adaptar. Mas, no geral, a maioria das poses são autorretratos, o que dá um toque mais pessoal e autêntico às obras.
Qual foi a sensação de expor no Espaço Arte Brasil, que já recebeu tantos artistas renomados?
Expor no Espaço Arte Brasil foi uma experiência marcante e muito significativa para mim, especialmente por se tratar de um espaço que já recebeu artistas consagrados como Flávio Tavares, Abelardo da Hora, Brennand, Heloísa Maia e Miguel dos Santos. Estar lado a lado com nomes tão importantes da arte brasileira é um privilégio e uma sensação de reconhecimento enorme. Como um artista novo, sinto que entrar nesse espaço é como ser convidado para uma roda onde já estão grandes mestres. É desafiador, mas também emocionante. Além disso, vejo essa oportunidade como uma abertura importante para a nova geração de artistas, trazendo uma perspectiva contemporânea e dialogando com o tempo presente. Para mim, estar ali é ajudar a abrir caminhos, a criar um novo espaço de diálogo e a contribuir para que o ciclo de renovação artística continue vivo e se expanda. É uma sensação de sonho realizado.